sábado, 7 de agosto de 2010

Era uma vez (3)

Acordou com a chuva. Sentiu um arrepio. Olhou à volta e viu os outros animais da floresta indiferentes à chuva. Não gostava de frio nem de chuva e aquela talvez não tivesse sido a melhor escolha mas, dadas as circunstâncias, isso era o que menos o preocupava neste momento.

Os primeiros dias custaram muito a passar. Fazia um grande esforço para se distrair e para comer. Se os esforços em se distrair ainda resultavam o mesmo não se podia dizer dos esforços para comer. Era impossível. Valia-lhe a água que ia bebendo e os frutos que conseguiam disfarçar que eram comida... quanto mais aquosos melhor. Perdeu peso. Sabia que era essencial manter o peso para que as penas voltassem a nascer, mas nem assim. A dor era mais forte que a vontade de ter penas. Pelo menos por enquanto.

Os dias foram passando e ele começou a pensar se não seria boa ideia ficar naquela floresta definitivamente. Para isso bastava que conseguisse um ninho seu numa árvore desabitada. Parecia-lhe simples e esta ideia começou a animá-lo; vida nova, floresta nova, tudo novo.
Sempre teve um desejo secreto de aventura e agora parecia-lhe o momento adequado de arriscar, afinal não tinha nada a perder... já tinha perdido tudo.
Foi procurar uma árvore nova. Não encontrou. Perguntou aos seus novos vizinhos se sabiam de alguma árvore desabitada. Havia muitas, responde um deles, mas a semana passada chegaram novos animais e ocuparam-nas... devias ter procurado mais cedo, acrescentou. Procurou e fartou-se de procurar. Sem sucesso. Procurou em florestas vizinhas e nada. Nem uma árvore havia, por mais pequena que fosse. Estavam todas ocupadas.

Percebeu que não tinha alternativa e que teria de regressar. A tristeza voltou a invadi-lo. Eu não quero ir, pensava, não quero voltar a ver tudo aquilo. E por mais esforços que fizesse para não regressar, nada surtia efeito. Tentou tudo. Sempre. Até ao dia da partida,  e quando esse dia chegou, resignado, regressou à sua floresta de origem.

3 comentários:

  1. «Titubeantemente foi-se afastando, tentava não olhar para trás, mas cada vez que ouvia um barulhinho lá se voltava ele na esperança de ver a gaiola de pé.»

    Estranha forma de vida...

    Abraço

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  2. De acordo, Paulo!
    Obrigada pela visita.

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